Saúde Mental

Psicólogas do CAPS de Marialva publicam texto sobre saúde mental, pandemia e isolamento

Quinta-feira, 07 de maio de 2020

Última Modificação: 01/07/2020 15:03:01 | Visualizada 839 vezes

Texto faz uma análise sobre o momento desafiador que estamos passando atualmente


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SAÚDE MENTAL, PANDEMIA, ISOLAMENTO

É muito difícil pensar em orientações gerais à população no contexto da pandemia da Covid-19. Isso porque receio que as pessoas tomem esse texto como instruções que precisam ser seguidas como um passo a passo: receita de bolo (Karine Dutra, do núcleo de Saúde Mental Álcool e outras drogas - Fiocruz). Se você que está lendo e busca exatamente isso: pare agora! Já adianto que sou péssima com bolos, quem dirá com instruções desse tipo! A ideia é oferecer um espaço de ampliação e elucidamento acerca dos nossos pensamentos e sentimentos em um momento de tanta nebulosidade e incertezas que temos vivido nesses meses. 
Enquanto psicóloga, a área de desastres e emergências é um campo que nunca havia estudado, totalmente novo para mim. Atuar nesse cenário fez com que tivesse que repensar a minha prática e minimamente tentar planejar como oferecer cuidado em Saúde Mental na pandemia, e o que complexifica mais o trabalho de nós, profissionais da saúde é que a emergência do outro também é a minha. É campo que a própria formação não possibilita essa imersão e contato, como se não contássemos que essa demanda pudesse aparecer.
Nesse processo de estudo, alguns aspectos fizeram bastante sentido para mim. Um deles fala justamente do modelo super-exigente com as pessoas. Uma cobrança exacerbada sobre um padrão de produtividade. Faça exercícios regularmente, durma bem, se alimente bem. Não é que isso esteja errado, cognitivamente todo mundo sabe que esses aspectos são saudáveis. Mas, o que me chama a atenção, é o rigor com que eles estão sendo impostos e o rigor com que as pessoas estão se cobrando. Uma espécie de robotização. Se permita pausar e respirar.
São tempos de muito sofrimento, para mim, para você, para o seu vizinho, para as crianças, para os bebês, para os adolescentes, para os idosos: para todos.
Ouço pais desesperados ao perceberem que seus filhos choram, ficam entediados. Como se as crianças não pudessem manifestar comportamentos de irritação ou tristeza! Não se iluda pensando que os pequenos não sentem nada. É impossível! Eles estão convivendo com o sofrimento dos adultos, eles também tiveram a rotina toda modificada.
Acho que em relação a isso eu pensaria justamente no movimento contrário. Se permita chorar, se permita sentir. Acolha como real a demanda do seu filho. Ele está pedindo ajuda. Aproveite isso! Nós, adultos, geralmente não temos mais essa capacidade de gritar por ajuda de forma tão viva como as crianças e os adolescentes. As emoções deles não tem um filtro gasto como as nossas. Observe-se caso seu filho manifeste um comportamento extremo. Como eu estou agindo? Como ele está se sentindo? Qual é a minha forma de informar o que está acontecendo? Tente “pirar” longe dele/a – o banheiro pode ser uma opção. Se isso não for possível, explique, depois que o pico de dor passar, que você estava com sentimentos difíceis, mas que vai tentar encontrar outras formas de se tranquilizar. E não se esqueça, somos referência de proteção para as crianças.
As pessoas perguntam: e agora, o que eu faço está doendo, estou muito agitado ou sem vontade de fazer as coisas ou querendo limpar muito as coisas? A doutora em psicologia e pesquisadora do SMAPS Débora Noal nos ensina a fazer outra pergunta: “O que eu já fazia?”. Dentro das minhas vivências, o que eu conheço que ajuda a resgatar uma sensação de tranquilidade emocional? Quais recursos eu desenvolvi para lidar com situações difíceis que se assemelham a essa que vivo agora? O que eu posso fazer dentro do meu campo de possibilidades? Débora utiliza a metáfora da caixa de ferramentas para elucidar esse movimento pessoal. No sentido de que cada pessoa precisará resgatar as ferramentas que já possui para utilizar nesse momento. Não é hora de buscar ações novas, mas de se concentrar naquilo que já se conhece e que já se fazia. 
A nossa mente está sendo exposta a um perigo volátil, existe um risco, mas não se sabe de onde vem. Esse medo é real, e ele é novo. Contudo, emocionalmente, ninguém aguenta viver a sensação mais humana de todas de que nós não temos o controle de nada. É normal apresentar esses pequenos desarranjos emocionais. Na minha experiência pessoal, nada me fez entrar tão em contato com esse sentimento de falta de controle como o puerpério, (período inicial após o nascimento de um bebês), interessante como paulatinamente ele vai saindo da nossa memória, não dá para viver sob essa emoção o tempo todo. Nós precisamos buscar os nossos recursos de retomada da sensação de conforto emocional. O que te ajuda a se aproximar desse conforto? 
Para algumas pessoas a espiritualidade é um instrumento importante. E aquelas que participavam de grupos e coletivos para praticar a sua fé, porque não utilizarem aplicativos para se reunir online e estarem juntos?!? A psicóloga Débora deu um exemplo muito bonito no curso da Fiocruz pensando em pessoas que não tem acesso a internet. “Higienize as mãos, a caneta e escreva uma carta para um idoso que você ama e que não tem acesso a internet. Deixe na sua caixa de correios”. Leve desenhos dos netos, uma comida que ele goste. 
Para alguns pode fazer sentido assistir a seus filmes e séries preferidos, sabe, aqueles que já se sabe a fala dos personagens?!?! Aquele tipo que dá a sensação de que nada mudou. De que pelo fato de conhecermos ele muito bem já sabemos como tudo vai terminar, já sabemos o começo o meio e o fim e que por isso é possível se acalmar já que a sensação “de controle” nos é dada.
As manifestações de cuidado, em nossa cultura, estão intimamente ligadas ao toque. Como estar afetivamente ligados sem se tocar? Essa resposta é muito pessoal e a história de vida de cada um é o que vai sinalizar os caminhos. E sim, precisamos repensar e recriar a nossa forma de se relacionar e se ritualizar. 
Se proponha pensar a humanidade de forma mais ampliada, enquanto coletivo. Exercite a ação de se colocar no lugar do outro. Tente olhar o mundo com o olhar do outro.  Mantenha-se conectado a sua rede de apoio e afeto. Cuide do outro e de você mesmo como cuidaria daqueles que mais ama. 
Evite excesso de informação isso tende a causar angustia. E caso julgue necessário, procure ajuda profissional. 

Autora: Psicóloga Maria Rosa Rigoni Fialho CRP 08/15144
Contribuições: Psicóloga Maria Aparecida Santiago da Silva CRP 08/15326 e Psicóloga Rayane Brugnolle CRP 08/31386

Fonte: Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Marialva

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